Nos 58 anos da transladação do seu corpo, em 17 de Maio de 1964, para o cemitério de Vila Viçosa
Eu sou o que no mundo anda perdida,
Eu sou o que na vida não tem norte,
Sou a Irmã do sonho, e desta sorte
Sou a crucificada...a dolorida... (livro de Mágoas, 1919)
Assim se definia, esta grande poetisa alentejana. Da sua vida, muito se conta, mas as grandes verdades, leem-se nos seus sonetos.
Florbela Espanca, nasceu dia 8 de Dezembro de 1894, na Rua do Angerino em Vila Viçosa, Florbela começa precocemente a frequentar a secção infantil da escola primária de Vila Viçosa em Outubro de 1899.
Tendo iniciado um mês antes as aulas da 3ª classe, Florbela escreve, a 11 de Novembro de 1903, a sua primeira poesia reconhecida, intitulada “A vida e a morte”; no dia seguinte outra se lhe sucede – trata-se de um soneto, que começa com “A bondade o som de Deus”. Se se atentar no facto de que Florbela ainda não tem nove anos e na dificuldade que o soneto representa enquanto composição poética, fácil se torna concluir que cedo brotou o génio nesta alma que “já (então) fazia versos, já tinha insónias e (a quem) já as coisas da vida davam vontade de chorar”.
Florbela era uma poetisa de poesia generosa, convulsa e ardente do fogo sob cujo signo nascera, a dos extremos de ternura e das amarguras do sofrimento, dos estados hiper excessivos de consciência da solidão, da dor e do amor.
Nas vésperas de morrer, Florbela desabafa com as suas amigas dizendo que se suicida no dia do seu aniversário por considerar que é a melhor prenda que pode dar a si própria; contudo, ninguém a leva a sério, ninguém entende a sua tormenta. Esta escreve, pois, as suas últimas vontades e um postal de despedida às amigas mais íntimas, as quais só receberão depois da sua morte.
No dia 10 de Dezembro de 1930 à noite, Florbela comunica à sua criada Teresa que não vai dormir no quarto de casal, em virtude das muitas insónias que vem sentindo ultimamente. Pede ainda que não a acordem no dia seguinte seja sob que pretexto for.
É encontrada tarde de mais. Na sua mesinha de cabeceira restava um pouco de leite num copo e debaixo do colchão estavam dois frascos vazios. Florbela morrera enfim durante a noite, provavelmente à mesma hora da madrugada a que tinha nascido trinta e seis anos antes, no dia de Nossa Senhora da Conceição, símbolo da Mãe e padroeira de Portugal.
Nada melhor que a sua própria autodefinição, transcrita numa das cartas que escreveu (Carta de Florbela Espanca ao Dr. Guido Battelli de 27/07/1930).
(…) Sou uma céptica que crê em tudo, uma desiludida cheia de ilusões, uma revoltada que aceita, sorridente, todo o mal da vida, uma indiferente a transbordar de ternura. Grave e metódica até à mania, atenta a todas as subtilezas dum raciocínio claro e lúcido, não deixando, no entanto, de ser uma espécie de D.Quixote fêmea a combater moinhos de vento, quimérica e fantástica, sempre enganada e sempre a pedir novas mentiras à vida, num dom de mim própria que não acaba, que não desfalece, que não cansa! (...)