O documento original encontra-se arquivado no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, compondo-se de vinte e uma páginas manuscritas em letra caligráfica do século XVIII. Com o código de referência nº PT/TT/TSO-IL/028/00836 , e cota actual do Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc. 836.
“Crime de Solicitação”
O caso do processo do Frade João da Trindade, de trinta e sete anos, julgado e condenado nos Estaus, sede do tribunal do Santo Ofício, mais conhecido por Inquisição, onde actualmente se situa o teatro D, Maria II, no Rossio em Lisboa, tratou-se de facto do julgamento de um prelado desencaminhado pelos prazeres carnais, (como menciona o respectivo processo), igual, com certeza, a tantos outros que proliferaram pelo país fora, que a inquisição julgaria e na maioria das vezes condenaria, senão à fogueira pelo menos ao degredo, como no caso deste conterrâneo, que aqui se transcreve.
Interessando a nós, leitores e residentes em Garvão o facto do Frade João da Trindade e alguns familiares seus, serem naturais e residentes no antigo concelho de Garvão, mais concretamente tanto na própria vila sede do concelho como no Monte da Corte em Santa Luzia, (uma das duas freguesias do extinto concelho de Garvão).
Ao Frade João da Trindade, religioso da ordem de São Francisco da Observância da Província dos Algarves, sacerdote e pregador, morador no convento de Nossa Senhora do Loreto junto a Santiago do Cacém e assistente no Convento de Xabregas de Lisboa Oriental, é-lhe imputada a acusação de “solicitação”, que confessa, na pessoa de Maria Bernarda, também ela moradora no Monte da Corte, Santa Luzia, e ao que parece terceira da ordem de São Francisco.
De facto, depois de pormenorizadamente relatar o sucedido foi-lhe imposto o degredo de residência com a obrigação de se apresentar regularmente nos Estaus.
“Prova de pureza de sangue”
O caso não se resumiria ao agravo de “solicitação” do Frade João da Trindade, e ao que parece, entre dois religiosos, este teve igualmente de fazer prova de pureza sangue, como se observa no capítulo dedicado à genealogia, para despiste de algum descendente de sangue judio, assim para além dos nomes do pai e da mãe teve igualmente de descrever os nomes dos avós, tanto paternos como maternos, os locais de nascimento, moradas e ocupações.
Era filho de Jerónimo da Fonseca, capitão da Ordenança de Garvão onde era morador e natural da freguesia de nossa Senhora das Relíquias, termo de Odemira e de Maria bernarda, (por mera coincidência, com o mesmo nome da “solicitada”), natural de Garvão e moradora, também, no Monte da Corte. Tendo como avós paternos Domingos Afonso e D. Clara, cujo sobrenome não sabe, nem profissões, naturalidade ou residência, e dos avós maternos o avô se chamava Ildefonso Correia morador em Garvão e da avó não sabe o nome nem de onde era natural.
Mais declarou que nunca foi casado nem tem filhos ilegítimos e que foi baptizado na Igreja de Santa Luzia pelo Padre Manuel (?) Ribeiro, sendo seu padrinho João de Aboim Pereira Guerreiro, Mestre de Campo da Comarca do campo de Ourique, e que foi crismado, mas não se lembra onde recebeu o dito sacramento, parece que pelo Padre conhecido por Barata em Bela tendo como padrinho Luís Fernandes.
Teve de fazer prova igualmente de que sabia ler e do Padre-nosso, Ave-maria, o credo e restantes mandamentos da Madre igreja.