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Nov 18

CENTENÁRIO
“O famigerado heroi do Crime Grande da Estação do Rocio”
A PRISÃO - O FALSO RELATÓRIO MÉDICO
Parte 9 (de 12)


          Preso nos calabouços do Governo Civil de Lisboa, José Júlio da Costa foi brutalmente espancado e torturado durante dias e só o pedido para que o deixassem falar terá salvado a sua vida.
          Contudo se no processo de investigação ao acto de José Júlio da Costa havia forças que procuravam desenvolver o seu trabalho, outras havia que procuravam subverter a justiça e terão contribuído para aumentar a desconfiança no defensor oficial do preso e requerer formalmente um exame pericial sobre o seu estado mental.
          Assim, em Junho de 1920, José Júlio da Costa foi submetido a um exaustivo exame psicológico, por prestigiadas figuras médicas da altura, nomeadamente o psiquiatra Júlio de Matos que posteriormente daria o seu nome ao Hospital Psiquiátrico de Lisboa, pelo médico e professor de psiquiatria Sobral Cid, igualmente com uma unidade hospitalar com o seu nome em Coimbra e do psiquiatra Caetano Beirão, um dos fundadores do Hospital Psiquiátrico Miguel Bombarda.
          As conclusões desse exame eximem José Júlio da Costa de qualquer perturbação mental que o levasse a cometer o atentado e como tal imputável perante a justiça, segundo o Relatório sobre o estado mental de José Júlio da Costa apresentado pelos mencionados psiquiatras em 10 de Fevereiro de 1921.
          Contudo apesar deste parecer bastante categórico sobre o estado mental do preso e apesar de já ter o julgamento marcado para o dia 31 de Março de 1921, no dia 5 desse mesmo mês e ano, vinte e cinco dias depois da emissão desse relatório médico e vinte e seis dias antes do julgamento, o médico prisional António José Furtado de Mendonça Boavida redige um relatório, para o ministério da Justiça, sobre o estado mental de José Júlio da Costa, no qual, arredado de qualquer investigação médica independente e baseado em pressupostos que entravam em conflito com o relatório médico dos três psiquiatras, pura e simplesmente, recomenda o “internamento deste num manicómio para ser observado por um psiquiatra”, o que levou o Procurador da República, Pais Rovisco, no antigo convento da Boa-Hora, agora convertido em tribunal, a adiar o julgamento indefinitivamente.
          Com que bases Mendonça Boavida faz esta analise?
        Que pressões terão havido para vinte e cinco dias depois da emissão do relatório médico por três conceituados psiquiatras portugueses que o davam com uma sanidade mental sã e em condições para ser julgado, fazer um juízo destes? Do que é que o advogado defensor de José Júlio da Costa se apercebeu para requerer um exame mental ao preso? A quem é que interessava que vinte e seis dias antes do julgamento o dessem como inimputável perante a justiça?
         Que forças se movimentavam nos bastidores que não permitiram o seu julgamento e o devido depoimento em tribunal? Porque não foi feito então outro exame psiquiátrico ao preso, antes de o submeter novamente a julgamento, como o próprio Mendonça Boavida sugeria?
          De facto o relatório de Mendonça Boavida se por um lado é bastante perentório sobre o estado mental de José Júlio da Costa, na medida em que tem a palavra final e o surripiou ao julgamento público, por outro lado não deixa de ser ambíguo na decisão que tomou e do exame que faz do preso.
          Contudo acontecimentos posteriores à noite sangrenta e à sua libertação, muito dificilmente esta versão sobre o estado mental de José Júlio da Costa se mantêm. Torna-se de facto insustentável justificar, baseado numa alineação mental, como se manteve fugitivo todos esses anos até à definitiva mudança da situação politica com a instauração do Estado Novo, saído do golpe de 28 de Maio de 1926.
           Quem estaria envolvido? Muitos e muitos eram de facto os interessados ou cúmplices que pactuaram com a tramoia, capazes de subverter instituições que se queriam íntegras e independentes.

 

In: José Pereira Malveiro, José Júlio da Costa - O Famigerado Herói do Crime Grande da Estação do Rocio, Garvão, 2018. 

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publicado por José Pereira Malveiro às 09:11

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