24
Jul 20

Dias da semana

 

                Porque é que Portugal é o único país da Europa Ocidental a nomear os dias da semana, (do latim, septimana, "sete dias"), pela terminologia eclesiástica católica, (Feria secunda, Feria tertia, Feria quarta, Feria quinta, Feria sexta, Sabbatum, Dominica Dies), e não pelos nomes latinos pagãos, (Lunae dies, Martis dies, Mercurii dies, Jovis dies, Veneris dies, Saturni dies e Solis dies), como se observa nos restantes países?

                Em mais nenhum país católico do Oeste Europeu, se observa tal, tanto a Espanha, como a França, como a Itália e até mesmo o próprio Vaticano, continuam a nomear os dias da semana pelos antigos nomes pré-cristãos.

 

                Lunes, Martes, Miércoles, Jueves, Viernes, Sábado e Domingo, em espanhol.

                Lundi, Mardi, Mercredi, Jeudi, Vendredi, Samedi e Dimanche, em francês.

                Lunedi, Martedì, Mercoledì, Giovedì, Venerdì, Sabato e Domenica, em italiano.

                Luni, Marţi, Miercuri, Joi, Vineri, Sambata e Duminica, em romeno.

 

                O que de uma forma geral denomina: dia da Lua, dia de Marte, (deus da guerra romano), dia de Mercúrio, (deus na mitologia romana), dia de Júpiter, (deus na mitologia romana), dia de Vénus, (deusa do amor), dia de Saturno, (culto pagão do deus da agricultura) e dia do deus sol, depois transformado em dia do senhor, dominus dei.

                O mesmo se passa nos restantes países europeus, de expressão Anglo-saxónica e religião protestante ou Anglicana.

 

                Montag, Dienstag, Mittwoch, Donnerstag, Freitag, Samstag e Sonntag, na Alemanha.

                 Que significam, dia da Lua, dia de Tyr, (deus da guerra), dia do meio da semana, dia de Thor, (deus do trovão), dia de freya, (deusa da fertilidade), dia de Saturno e dia do Sol.

 

                Em inglês: Monday, Tuesday, Wednesday, Thursday, Friday, Saturday e Sunday.

                Cujo significado não difere muito dos dias de semana alemão, dia da Lua, dia de Tyw, (deus da guerra), dia de Odin, (divindade Anglo-saxônica), dia de Thor, (deus do trovão), dia de freya, (deusa da fertilidade), dia de Saturno e dia do Sol.

 

                No mundo Galaico-português, na Galiza continua-se a nomear os dias da semana segundo o panteão pagão, Luns, Martes, Mércores, Xoves, Vernes, Sábado e Domingo, e em português antigo, nomeava-se por: Lues, Martes, Mércores, Joves, Vernes, Saturnai e Solis, correspondente à actual, Segunda, Terça, Quarta, Quinta e Sexta-feira, Sábado e domingo.

 

                Portugal foi assim o único país do mundo que adotou os dias da semana derivados do latim eclesiástico. Os nomes antigos dos dias da semana, nomeados por outros povos, não foram mantidos na língua portuguesa, tal mudança deveu-se a São Martinho de Dume, nomeado Bispo de Braga em 596, fervoroso anti pagão e a todos os costumes associados ao paganismo, adoptou nas igrejas sob jurisdição da Sé de Braga, os dias da semana segundo a nomenclatura eclesiástica católica, tradição que se manteve até ao século XV, quando foram definitivamente adoptados no resto do reino.  .  

 

«Os cultos astrais – recorda oportunamente Aires Nascimento – haviam sido particularmente visados nas condenações dos priscilianistas, nomeadamente no I Concílio de Braga. E em diversos testemunhos, ao lado do culto do Sol e da Lua, ou das estrelas, aparece documentada a existência do culto ao fogo e às águas».

Em finais do séc. VI, também o II concílio de Braga (572), celebrado sob a presidência de Martinho de Dume (510-580), metropolita daquela zona, faz referência à observação e culto tradicional que os gentios faziam dos elementos naturais, do curso da lua, das estrelas e dos signos antes de iniciarem a construção de uma casa, fazerem a sementeira, plantarem árvores ou contraírem matrimónio (c. 72).

Na obra De correctione rusticorum, que o mesmo Martinho endereça a Polémio, bispo de Astorga, repreendem-se os camponeses por acenderem velas junto às pedras, às árvores, às fontes e às encruzilhadas (nam ad petras, et arbores, ad fontes, et per trivia cereolum incendere) e realizarem oferendas em festividades como as calendas ou os deuses domésticos, além de se condenar a idolatria, a adivinhação ou os augúrios e a bruxaria e instar os cristãos a deixar de designar os dias da semana pelos nomes latinos pagãos (Lunae dies, Martis dies, Mercurii dies, Jovis dies, Veneris dies, Saturni dies e Solis dies) para passar a designá-los pela terminologia eclesiástica (Feria secunda, Feria tertia, Feria quarta, Feria quinta, Feria sexta, Sabbatum, Dominica Dies).*

 

 

* Aires A. Nascimento, «A “Religião dos Rústicos”», art. cit., p. 326. In: Luís Mata, O «cais» de Santa Iria uma reflexão sobre uma velha questão, REVISTA LUSÓFONA DE CIÊNCIA DAS RELIGIÕES – Ano VI, 2007 / n. 11 – 277.

publicado por José Pereira às 22:19

16
Jul 20

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RENÉ DESCARTES

 

Não será demais, nestes pandémicos incertos tempos, lembrar René Descartes.


Penso, logo existo.

 

Em contraste com a postura americana, perante esta pandemia, que de facto é a antítese da mensagem original de Descartes.

 

Parei de pensar, logo não existo.

 

Esta simples frase, "penso, logo existo", do filósofo francês René Descartes, (1596-1650), ajudou em muito a mudar a mentalidade da época. O trabalho inovador de Descartes na área do racionalismo, acabou por abriu os portões ao Iluminismo, numa época em que ainda ardiam nas fogueiras as acusadas de bruxaria.

 

A frase, sintetiza, de uma maneira simples o pensamento de Descartes e surgiu a partir da postura em questionar o que se tinha por garantido. Para se chegar ao conhecimento absoluto, para este filósofo, era preciso duvidar de tudo o que existe ou nos rodeia.

 

Para Descartes, a única coisa de que não se podia duvidar era da própria dúvida e, consequentemente, do seu pensamento, e se duvido de tudo, estou dotado da capacidade de raciocinar e se o meu pensamento existe, eu também existo, assim, Penso, logo existo.

 

Perante esta lógica, é caso para perguntar, se perante esta sociedade cada vez mais globalizada, cada vez mais manipulada e influenciada pelos modernos órgãos de comunicação, se perdemos a nossa capacidade de criticar, de analisar, de sugerir, de contestar ou se nos acomodamos aos que os média nos querem transmitir.

 

O que nos ensinaria este matemático, físico e filósofo que influenciou gerações de pensadores, de Isaac Newton, Ayn Rand a John Locke, (filosofo político que influenciou Thomas Jefferson), da atitude americana perante o Covid-19 e perante um presidente altamente narcísico, ignorante e perigoso?

 

Terão os americanos perdido a capacidade de pensar, perante o impacto real do vírus e a crise económica que se adivinha? Perante as ações cada vez mais disparatadas dum presidente mais preocupado com a reeleição? Perante um poder dos meios de comunicação que nos doma, amacia e nos controla?

 

Será que em pleno século XXI, quantos americanos estarão de facto a questionar o que realmente se está a passar? O motivo de mais mortes? A falta de uma política de contenção deste vírus?

 

Caso contrário, a América provará a antítese da mensagem original de Descartes: "Parei de pensar, logo não existo".

publicado por José Pereira às 18:50

13
Jul 20

A ligação à Galiza

 

Qual a antiguidade do nome de família Malveiro?

O que é que terá surgido primeiro, o lugar ou o apelido?

Se em termos toponímicos temos vários exemplos de Norte a Sul no mundo Galaico-português, também em termos patronímicos se encontram diversas famílias a portar este sobrenome.

 

Se até agora as diversas pesquizas se têm debruçado sobre a origem deste toponímico/patronímico em Portugal, localizando a mais antiga referência ao apelido Malveiro no século XV, (de realçar aqui as contribuições de José Maria Ferreira, Beatriz Rodrigues, Ana Josué, Luís Soveral Varella e J. Valdeira entre outros, no site “geneall”), têm surgido ultimamente, graças à entrada de novos documentos on-line e ao Google maps, novas informações sobre este nome, desde o século XIII, não só em Portugal mas igualmente na Galiza e na França, caso incluamos a localidade francesa de Malvières.

 

No livro “Coisas Velhas de Velhos Tempos”, Amândio Quinto,[1] referencia a povoação da Malveira, no concelho de Mafra, em 31 de Março de 1363, pois neste ano o Prior de Santa Maria de Cheleiros, Vicente Annes Fróis, faz referência ao Casal da Malveira no seu testamento.[2]

 

Da origem deste logar nada se pode averiguar, sabe-se que no anno de 1363 já existia o Casal da Malveira; pois que assim foi mencionado nas disposições testamentarias feitas pelo padre Vicente Annes Froes, prior de Santa Maria de Cheleiros, em 31 de março daquelle anno. [3]

 

Já antes, em 1261, no reinado de D. Afonso III, surge uma outra referência à Lezíria da Malueyra, segundo informação do mesmo autor na: obra de pesquisa histórica, ORIGENS DAS REGIÕES, senhor VALDÊZ – que viveu na Malveira, bem como seus descendentes – realizada ainda no século XIX (previsivelmente concluída no ano de 1896), [4]

           

No Riba Tejo, defronte de Villa Franca de Xira, ha uma leziria com o nome de Malveira, que nos primeiros tempos da monarchia era tambem conhecida pela de D. Sancha.

O alcaide, alvasis e todo o concelho de Santarem fizeram de sua livre e espontanea vontade em 15 de dezembro de 1261 doação a el-rei D. Affonso III da leziria “Malueyra, e outras".[5]

               

Esta referência de 1261, remete-nos para o período das guerras de reconquista, não sendo prudente, pelo menos nesta fase da investigação, idealizarmos uma origem noutras línguas anteriores à reconquista cristã, contudo, tudo aponta para estamos perante uma denominação já existente nos princípios da nacionalidade.

 

Ainda sobre as doações, referentes a esta leziria Malueyra, o mesmo autor, menciona a doação efetuada no reinado de D. Dinis em 1318 e no reinado de D. Pedro I em 1357.

 

  1. Diniz, em 23 de julho de 1318, fez em Lisboa doação a Estevão da Guarda da leziria, que chamavam de D. Sancha, e estava no meio do rio Tejo, contra Santarem, sobre a Malveira".[6]

 

  1. Pedro I por carta passada em Lisboa a 29 de junho de 1357, confirmou a doação a Estevão da Guarda da sua leziria Malveira, que também chamavam de a Sancha, e estava no meio do rio Tejo. [7]

 

Constituida em 1836 a Companhia das lezirias do Tejo e Sado, passou a leziria da Malveira dos almoxarifados da corôa para a posse da dita Companhia.[8]

 

(…) Hey por bem, & me praz que daqui em diante nenhum barqueyro vá ás ditas Eyras das terras do dito Almoxarifado da Malveyra, (…)[9]

 

Na Galiza. encontra-se identificado nos mapas, junto à Igreja de Santa Maria de Seteventos, no concelho de Savinhão, em Lugo, um lugar designado por Malveiros. Segundo Mª Teresa C. Moure Pena,[10] referindo um documento de 1389, do antigo mosteiro de Monjas Beneditinas de Santo Estebo de Chouzán, em carballedo, Lugo, Galiza, descreve as desavenças sobre a herança de vários bens fundiários,

 

"Era de naçenda de Ihesu Christo de mill e trecentos e oytenta e nobe annos oyto dias de março estando en villa (…), (…) e deron a dita Moor Lourenço sua tya en partiçom hun casar de herdade en Malveyros que e su o syno de Sancta Maria de Seteventos (…)[11]

 

Em Pastoriza, na Corunha temos a Rua Malveira.

 

Encontra-se igualmente em Cariño na Corunha, no mar Cantábrico, a ilha Malveira, assim como os miradouros Malveira um e dois e a Penha Malveira, assim como a associação de atividades lúdicas, a Agrupación Cultural Malveira.

Por sua vez, junto a Vilagarcia de Arousa em Pontevedra, já no Oceano Atlântico, vamos encontrar a Ilha Malveira Grande e a Ilha Malveira Chica, assim como a Asociación Cultural Malveiras em Vilagarcía de Arousa.

Apesar de afastadas cerca de 185 km uma das outras, estas ilhas denominadas por Malveira, têm em comum o facto de serem pequenas, sem condições de permanência humana e junto à costa.

 

O facto de se encontrar de Norte a Sul de Portugal, vários topónimos derivados da palavra Galiza, nomeadamente na zona da Malveira da Serra e da Malveira junto a Mafra, (Póvoa da Galega, Aldeia Galega da Merceana, Moinho da Galega e várias ruas, lugares ou becos denominados por Galega, Galegas, Galego ou Galegos), não é de excluir a origem Galega do toponímico Malveiro.

 

Contudo, também não é de excluir, a origem comum, no léxico Galaico-português, deste fonema, e a dispersão desta palavra tanto poderá ter ocorrido a partir dos locais na Galiza como de Portugal. A nomeação de um certo lugar, no linguajar Galaico-português das gentes da altura, a partir de uma determinada característica, veio a influenciar a sua denominação e posterior transmissão aos moradores, povoadores ou proprietários.

 

Em França encontra-se igualmente a localidade denominada por Malvières, no departamento de Haute-Loire, no centro-sul da França. Segundo Mario Rossi, o termo Malvières provém de Malva.

 

Mauvières (Ruisseau des) Varenne-PArconce Même origine que Malvières en Haute Loire. Tous les auteurs sont d'accord pour voir dans Mauvières des lieux où poussent les mauves. Jadis les paysans cueillaient les mauves qu'ils consommaient en guise d'épinards.[12]

 

[1] Amândio Quinto. Coisas velhas de velhos tempos. Mafra: Câmara Municipal de Mafra, 2002.

[2] Algumas noticias para a descripção historica dos logares de Alcainça, Malveira e Carrasqueira do concelho de Mafra / coord. José Joaquim d'Ascensão Valdez, (1842-1926). - Lisboa: Typ. do Jornal O Dia, 1895. - 115, [2] p. ; 24 cm. - Transcrição de documentos do ANTT. - Capelas da Coroa; Livro 1 da Estremadura; Chancelaria de D. Dinis; Chancelaria de D. Pedro I. P. 5.

[3] Idem, p. 19.

[4] www.uf-malveira-alcainca.pt/cidadao/historia/malveira

[5] Origens das regiões na obra de Valdêz (século 18) P. 25/26.

[6] Idem, p. 104.

[7] Idem, Ibidem.

[8] Idem, p. 26

[9] Idem, p. 307.

[10] Mª Teresa C. Moure Pena. Revisión Histórico-Documental en torno al antigo monasterio Benedictino de San Esteban de Chouzán. Boletín do Museo Provincial de Lugo, Nº. 12, 2, 2005, págs. 125-170.

[11] Archivo de San Paio de Ante-Altares. Sección pergaminos. San Esteban de Chouzán. Cajón 3-Mazo 1 A-B-C. In: Mª Teresa C. Moure Pena. Revisión Histórico-Documental en torno al antigo monasterio Benedictino de San Esteban de Chouzán. Boletín do Museo Provincial de Lugo, Nº. 12, 2, 2005, pág. 155.

[12] Mario Rossi. Les Noms de lieux du Brionnais-Charolais témoins de l'histoire du peuplement et du paysage; Bourgogne du Sud. 2009 - ‎Brionnais (France). P. 407. (Mauvières (Ruisseau des) Varenne-PArconce. Mesma origem que Malvières em Haute Loire. Todos os autores concordam em ver em Mauvières os lugares onde as malvas crescem. No passado, os camponeses colhiam malvas que consumiam como espinafre.)

publicado por José Pereira às 07:24

05
Jul 20

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Revolta e Contestação

         Iniciado o processo de “arredondamento dos concelhos”, em 1834, no seguimento das reformas liberais que conduzirá à extinção de mais de metade dos velhos concelhos medievais portugueses, incluindo o de Garvão, irá ocasionar momentos de grande convulsão política e grandes tensões a nível local que este tipo de modificações irá sempre provocar.
            Este tipo de “revolta” popular, não só pela extinção do seu próprio concelho, mas igualmente por se recusarem a integrar outros concelhos tradicionalmente rivais, gerou em vários lugares do reino, verdadeiras revoltas contra estas medidas.
          Garvão não foi exceção à regra e se a documentação é escassa e a memória popular já há muito que se esqueceu de alguns desacatos ou protestos ocasionados pela extinção do concelho, surge-nos, contudo, um documento do reinado de D. Maria II, no qual o Procurador Geral da Coroa concede ao Administrador Geral interino de Beja, poderes para obrigar os vereadores do concelho de Garvão, extinto em 1836, a entregar os respetivos livros de atas e contas, (o cartório) e os restantes instrumentos inerentes à administração do concelho (alfayas), sejam eles, mobiliário, carimbos ou sistemas de aferição de pesos e medidas.
           De facto, pelo que se pode aferir deste documento, o protesto dos vereadores de Garvão estendia-se à recusa em concluir o inventário e em entregar o Cartorio e as AIfayas da Casa da Camara, ameaçando-os com o recurso ao Poder judicial de forma a apagar a antiga divisão dos Concelhos.

 

Sua Magestade a Rainha, Conformando-se com o parecer interposto pelo Procurador Geral da Corôa sobre a Representação do Administrador Geral interino de Beja, datada de 7 de Junho passado em que expõe as duvidas que tem encontrado a Camara do Concelho de Ourique a que foi anexado o de Garvão, por se recusarem os membros da extincta Camara a concluir o inventario, e entrega do Cartorio e das AIfayas da Casa da Camara, as quaes não apparecem; e bem assim sobre a diferença dos pezos e medidas dos dous Concelhos, e sobre a divida contrahida antes da annexação: Manda, pela Secretaria d'Estado dos Negócios do Reino, declarar ao referido Administrador Geral, para o fazer constar á Camara de Ourique, que deve esta demandar perante o Poder Judicial os ex-Vereadores da Camara de Garvão pelo facto de não entrega do Cartório e das Alfayas; que pelo que respeita aos pezos e medidas; devem permanecer os Padrões como actualmente existem, até que huma Lei regule definitivamente este objecto; e finalmente, que sendo o Concelho de Garvão unido ao de Ourique, com todos os seus direitos, obrigações, vantagens, rendimentos, e encargos devem por isso as antigas dividas passivas do Concelho extincto ser pagas pelo novo, assim como receberia este as dividas activas, se as houvesse; pelo que Sua Magestade recommenda ao sobredito Administractor Geral que empregue lodos os esforços para apagar a antiga divisão dos Concelhos, estabelecendo no Municipío huma única administração.

Palácio das Necessidades, em 1 de Agosto de 1837.
António Dias de Oliveirra
No Diar. do Gov. de 4 de Agosto nº 182. (1)

 

           Devido à excessiva proliferação de concelhos medievais, e se nalguns concelhos portugueses, observava-se um escasso número de habitantes, ou mesmo despovoados, o que acabava por ter efeitos contraditórios, tornando-os ingovernáveis por falta de moradores em número suficiente, para preencher os respetivos cargos autárquicos e judiciais, juízes e demais oficiais para servirem o concelho, tal não parece ser o caso de Garvão, pois segundo o censo do Conde de Linhares de 1801, o concelho de Garvão teria, 976 habitantes nas duas freguesias, Garvão e Santa Luzia, o que o tornava num concelho mediano em termos de habitantes e de área, e muito acima de alguns concelhos que não foram extintos como o caso de Alvito entre outros.
           Esta densidade populacional proporcionava, segundo Maria Fernanda Maurício, rendimentos suficientes para uma efetiva autonomia financeira.

 

Ao lado da sua autonomia administrativa, os concelhos possuíam autonomia financeira, o que significava cobrarem eles próprios as receitas com que custeavam as suas despesas: rendimentos dos bens próprios do concelho, direitos cobrados pela utilização dos bens comuns do concelho, pelo produto das coimas, pela violação das posturas, pelos rendimentos da almotaçaria, pelos rendimentos provenientes da aplicação da justiça, pelas rendas cobradas pela aferição dos pesos e medidas, pelas rendas das portagens e outros. Dentre as despesas, destacamos a «têrça», o jantar ou colheita, dadas ao senhor da terra, o pagamento aos funcionários concelhios, as despesas com a aposentadoria dos funcionários régios. O conjunto das receitas e das despesas constituía o orçamento do concelho.  (2)

 

 

(1) Collecção da legislação Portugueza desde a última compilação das Ordenações, Volume 10, pelo desembargador António Delgado da Silva, Lisboa, 1839, p. 679.
(2) MAURÍCIO, Maria Fernanda. Entre Douro e Tâmega e as Inquirições Afonsinas e Dionisinas, Lisboa, Colibri História, 1997. P. 234, 235. IN: CAETANO, Carlos Manuel Ferreira. As Casas da Câmara dos Concelhos Portugueses e a Monumentalização do Poder Local (Séculos XIV a XVIII). Lisboa: Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, 2011. dois volumes. Dissertação de Doutoramento. P. 63.

publicado por José Pereira às 16:52

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