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"Urna" de orelhetas perfuradas, de corpo ovoide, asas verticais (a meio da pança) decoradas por pastilhas circulares, e com tampa cónica terminada por elemento de preensão em botão maciço com a forma de cabeça antropomórfica (decoração pintada — bandas e filetes horizontais e xadrez —associada a decoração estampilhada e plástica).*

 

          A urna de orelhetas perfuradas, como consta na publicação de O Arqueólogo Português,* sobre a Notícia da primeira campanha de escavações, realizadas em 1982, no Depósito Votivo da II idade do Ferro de Garvão, recentemente posto a descoberto quando se procedia à abertura de valas para o saneamento básico da vila, Caetano de Mello Beirão, Carlos Tavares da Silva, Joaquina Soares, Mário Varela Gomes e Rosa Varela Gomes, dão-nos a conhecer, na referida publicação, o achado, entre centenas, senão milhares de peças de cerâmica, de uma peça em cerâmica decorada, a qual passou a ser conhecida por urna de orelhetas perfuradas
          Esta peça, apresenta uma tampa cónica, está encimada por uma cabeça antropomórfica, com toucado alto em forma de leque, com nariz proeminente e largo, olhos grandes circulares, marcados por incisão e boca com lábios salientes.
          Mostra, sob as orelhetas, duas asas, de perfil semicircular, colocadas verticalmente, decoradas com uma linha de pastilhas.
           O corpo desta urna está decorado com linhas de estampilhas de forma losangular, dispostas em paralelo, e por bandas horizontais, pintadas de cor vermelha, que também encontramos na tampa.
          Trata-se de um importante artefacto, com manifesto carácter votivo ou mesmo funerário, (deposição das cinzas após a cremação, pelos familiares do falecido), cujos melhores paralelos provêm de necrópoles ou de santuários da área levantina, alguns deles de grutas,(34) embora sem as características barroquizantes que integram este exemplar na "fantasia ibérica", conferida por Pellicer,(35) a outras peças de forma complexa ou com grande carga decorativa.
          Na Península Ibérica conhecem-se hoje muito mais de uma centena de urnas de orelhetas, distribuídas por cerca de setenta estações, sobretudo do Levante, observando-se na sua dispersão uma acentuada tendência litoral, sendo também conhecidas em Ibiza, revelando-nos o seu carácter exógeno e a sua origem no Mediterrâneo Oriental ou Central.(36)
          Reflectindo idênticas características, que encontrámos nos materiais de Buenache de Alarcón onde ressalta não só uma menor influência do comércio mediterrânico como aspectos arcaizantes, sobretudo no fabrico das cerâmicas, muitas delas montadas sem roda, é, ainda, peno de Cuenca, na necrópole de Las Madrigueras (Carrascosa del Campo) que, no túmulo III, estrato II, encontraremos uma urna de orelhetas perfuradas. É o único exemplar conhecido nesta estação, acompanhando, na mesma sepultura, duas pequenas umas, uma fabricada sem torno e outra carenada com pé em anel, de cerâmica cinzenta fina fabricada ao tomo, uma taça com bordo largo quase plano e duas outras com bordo ligeiramente introvertido e espessado no interior, uma delas de cerâmica cinzenta (forma 21 de Lamboglia), assim como um fragmento de concha, pequenos objectos de ferro e de bronze. Esta sepultura foi datada dos finais do século V ou do início do século IV a.C.(41)
          Uma tampa do povoado ibérico de Tossal de les Tenables (Lérida) encimada por uma cabeça antropomórfica, com os olhos em pastilha e o nariz proeminente, foi o único paralelo que encontrámos para a tampa da urna de Garvão. (42)
          Atendendo aos paralelos detectados, sobretudo em relação aos motivos corioplásticos, devemos datar a urna de orelhetas de Garvão entre os finais do século IV e a primeira metade do século III a.C.

 

* Caetano de Mello Beirão, Carlos Tavares da Silva, Joaquina Soares, Mário Varela Gomes, Rosa Varela Gomes. Depósito Votivo da II idade do Ferro de Garvão, Notícia da primeira campanha de escavações, in “O Arqueólogo Português, série IV, volume 3, 1985. P. 45.

 

(34)- PÉRES, J. A. – El culto en cuevas en la region valenciana. “Revista de la Universidad Complutense”, XXV, n.º 101, pp. 9-30, (Homenage a Garcia Bellido, I), 1976.

(35)- PELLICER, M. — Las primeras cerámicas a torno pintadas andaluzas y 5145 problemas, in "Tanessos y sus Problemas: V Symposium Internacional de Prehistoria Peninsular", Barcelona 1969, pp. 291-310, espec. pp. 54-55, 310.

(36)- FLETCHER VALLS, D. — Las urnas de orejetas perforadas, in "Actas del VIII Congreso Nacional de Arqueologia", 1963, Zaragoza, 1964, pp. 305-319. JULLY, J. J.; NORDSTROM, S. — Les vases à oreillettes perforées en France et leurs similaires en Méditerranée Occidentale. "Archivo de Prehistoria Levantina", XI, 1966, pp. 99-124. NORDSTROM, S. — La céramique peinte ibérique de la province d'Alicante (Acta Universitatis Stockholmiensis, VI), 1973, II, pp. 174-176. BEIRAO, C. M.; GOMES, M. V. — A necrópole da Idade do Ferro do Gaitado (Vila Nova de Milfontes). "O Arqueólogo Português", série IV, 1, 1983, pp. 207-266, espec. pp. 231-233, fig. 18.

(41)- ALMAGRO GORBEA, M. — La necrópolis celtibérica de "Las Madrigmeras-Carrascosa del Campo" (Cuenca) (Excavaciones Arqueológicas en Espafia, 41), Madrid, 1965. ID. — La necrópo-lis de "Las Madrigueras-Carrascosa del Campo" (Cuenca) (Biblioteca Praehistorica Hispana, X), Madrid, 1969, pp. 38-40. BEIRÃ(); GOMES - op. cit. (v. nota 36), p. 251.

(42)- PERICOT, L. — Ceramicas ibéricas. Barcelona, Ediciones Polígrafa, 1979, p. 200, fig. 315.

publicado por José Pereira às 20:04

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